segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Mas um banco?

Apesar de todo o espanto e curiosidade que isso possa causar, eu trabalho em um banco. Sim, logo eu, a futura-jornalista. Em um banco. E essa é uma daquelas situações que faz (quase) todas as pessoas perguntarem se eu desisti da minha profissão, o que eu estou fazendo trabalhando em um lugar que não tem nada a ver com a minha área, blá blá blá...enfim, uma variedade de perguntas que eu ainda não consegui responder nem pra mim mesma.

E isso me irrita. Isso e mais uma porçãozinha de coisas chatas que estragam o meu dia e fazem eu subir a Borges de Medeiros aos prantos. Tá certo que não é sempre: às vezes eu espero chegar em casa pra desabar, às vezes eu tiro forças sabe-se lá de onde e fico com um bom humor inexplicável, e também às vezes tá tudo ok e eu não estou nem feliz nem triste.

Mas hoje não. Hoje era um daqueles dias em que eu queria sair chorando baldes pela rua, e foi o que eu fiz. Só que o motivo mudou assim que eu cruzei a porta de saída do banco.

Pausa pra explicação: todos os dias quando eu saio tem algum morador de rua encostado na porta. Eles ficam ali, sentados, e abrem pra que as pessoas que estão chegando/saindo possam passar. E sempre me desejam "boa sorte". Sempre. Retomando:

Depois de um dia de fortes emoções com os números, eu estava lá, quase alcançando a rua, segurando o choro o mais forte que conseguia, quando a porta se abriu. O menino da rua estava fazendo a cortesia pra um cliente entrar, como de costume. A diferença toda foi o diálogo:

Menino: boa noite!
Cliente: ué, cara? tá trabalhando pro banco agora?
Menino: eu? não, né. quem dera...quem dera eu pudesse trabalhar aqui.

O soco no estômago foi mais forte do que eu poderia aguentar. E olhem que eu não sou fraca. As lágrimas já estavam ali quase saindo, então foi só uma questão de não segurar mais. Chorei. Muito.

Muito porque todos os dias penso no que eu estou fazendo com a minha vida ao sair completamente do caminho do jornalismo. Logo o jornalismo, logo eu! Não é uma dúvida só minha. Todo mundo pergunta, todo mundo quer saber. Eu também quero saber. Eu e muita gente que também está lá sem saber direito o porquê. Por que não tem outra opção, porque essa é a melhor opção? Não sei. O fato é que se está lá. E que, seja como for, outros também queriam estar. Mas não podem.

Acho que eu posso ficar mais um tempo sem saber as respostas.

domingo, 27 de junho de 2010

De revirar o estômago

"Você nunca mais vai olhar para o jantar da mesma maneira", alerta o cartaz do documentário Food, Inc. Produzido por Robert Kenner com co-produção de Eric Schlosser (o mesmo de Fast Food Nation), o filme desconcerta. É com um raio-x da indústria de alimentos norte-americana que somos levados a questionar o que, de tão óbvio, chega a ser esquecido: de onde vem a comida que estamos comendo?

Questão básica, que tanto ouvi nas aulas de Jornalismo Econômico: precisamos saber a origem da matéria prima. Sem esta informação, todo o resto do trabalho sai prejudicado. No caso dos alimentos, é a saúde de cada um que perde. Não tem como não se preocupar.

O filme segue mais ou menos a mesma linha d'O Mundo Segundo a Monsanto, que também já indiquei aqui. Mas vai além. Apesar da situação preocupante em que nos encontramos, ele aponta soluções.

Podemos estar vivendo uma época na qual animais e plantas tem seu curso de vida modificado em nome de uma maior "produtividade", sim. Mas ainda restam alternativas. Fez lembrar muito a Feira Ecológica do Bonfim, que acontece todos os sábados de manhã, lá na José Bonifácio, onde depois fica o Brique. Um bom lugar pra começar a agir diferente - logo depois de assistir ao filme que eu recomendo muitíssmo, é claro:




domingo, 18 de abril de 2010

Garimpo ou Gestão?


Terminei de ler sexta-feira "Garimpo ou Gestão - Crítica ecológica ao pensamento econômico", de José Lutzenberger. O livro é um apanhado de textos do ecologista gaúcho, todos escritos na década de 1990, hoje organizados pela jornalista Lilian Dreyer - também autora da biografia de Lutz, "Sinfonia Inacabada". Passados quase 20 anos, é impressionante como todas aquelas idéias permanecem tão atuais. Impressionante e assustador, eu diria.

É através da oposição-título do livro, garimpo ou gestão, que o autor expressa sua principal preocupação: o contraste entre o que fazemos e o que deveríamos estar fazendo no trato com o planeta Terra, nossa mãe Gaia. Para Lutzenberger, a lógica econômica que pauta todas as relações humanas deveria ser repensada, pois "só a alienação predominante em nossa cultura pode fazê-la esquecer-se de que a economia não passa de um capítulo da ecologia".

Falando com a propriedade de quem conheceu de perto todos os malefícios que a indústria pode causar - durante 20 anos, trabalhou em empresas ligadas ao setor de química agrícola -, Lutzenberger propõe uma mudança através de gestos simples, individuais. Nada de grandes empreendimentos ou soluções megatecnológicas. Afinal, não podemos nos tornar ainda mais dependentes de uma estrutura cujo objetivo principal é o lucro. Pior: o lucro de poucos nada preocupados com os estragos que deixam pelo caminho.

O que precisamos para mudar, então? Se a mudança está no simples, não devemos nos sentir impotentes. Cada homem deve deixar de ser garimpeiro e tornar-se gestor. Deve deixar de fazer o que faz para, finalmente, fazer o que deveria fazer. E o que é isso? Eu diria que é uma maneira nova de ver - e viver - o mundo. E não tem coisa melhor que mudar de ares?

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E por falar em soluções simples, o projeto Común Tierra vai começar no mês que vem uma viagem desde o México até o Brasil na busca de modelos de comunidades sustentáveis. Ecovilas, fazendas ecológicas, tribos indígenas e tudo o que vocês podem imaginar estão no trajeto dos aventureiros Ryan Luckey e Letícia Rigatti (ela brasileira, gaúcha e da Fabico! hehe). A idéia é criar uma rede de comunicação entre todas essas iniciativas, pra que assim seja possível uma maior troca de idéias entre quem tem essa vontade de viver o mundo de uma maneira diferente. Vale a pena acompanhar!

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Apprivoise-moi!

Eu devia ter uns 10 anos quando li pela primeira vez "O Pequeno Príncipe". Li e não entendi porque tantas pessoas achavam significativa aquela historinha boba. E daí que um garotinho vindo de outro planeta tentava fazer amigos no deserto? Qual a graça? Só alguns anos depois eu entenderia.

Foi preciso rever alguns trechos da obra na aula de francês, já aos 18 anos, para compreender o que há de tão impressionante nos escritos de Saint-Exupéry. Antes tarde do que nunca - mesmo que seja pra entrar no coro do clichê mais clichê que pode existir: "tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas".

É uma raposa quem fala. Ela explica ao príncipe o que significa essa tal coisa de cativar os outros. É criar laços. É tornar pessoas outrora insignificantes, especiais. Encontrar significados no que aparentemente não diz nada. É cultivar uma amizade.

Permitam-me uma livre tradução do original:

"Nós conhecemos apenas as coisas que cativamos, disse a raposa. Os homens não têm mais tempo de conhecer nada. Eles compram todas as coisas prontas nos mercados. Mas como não existem mercados de amigos, os homens não têm mais amigos. Se tu queres um amigo, cativa-me!"

Sem pressa. Cativar aos outros - e às vezes até a si mesmo - não é uma tarefa simples. Requer tempo, dedicação e, principalmente, carinho. Pois é o tempo que gastamos cultivando nossas rosas que as torna especiais. Mais uma das lições da raposinha esperta que, só no segundo encontro, mudou a minha vida.

E eu tenho muitas rosas lindas no meu jardim.

ps.: "apprivoise-moi", título do post, é o mesmo que "cativa-me", em francês.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

A Imprensa e o Dever da Liberdade

Anteontem apareceu no meu quarto um livrinho do Eugênio Bucci, "A Imprensa e o Dever da Liberdade". Digo que apareceu porque eu não procurei por ele, minha mãe viu que estava escrito imprensa na capa e achou que eu ia gostar de ler. Vai entender, né.

O livro reúne seis textos sobre assuntos diversos, que vão desde a análise de uma peça de Nelson Rodrigues às diferenças entre as atividades exercidas por assessores de imprensa e jornalistas. Em comum, o dever de liberdade que deve - ou pelo menos deveria - reger a atividade jornalística.

Confesso que não me apaixonei pela leitura, chegando mesmo a considerar abandoná-la pela metade. Deu aquela sensação de textos de aula, sabem? Nada bom, principalmente quando as férias já estão quase no final e eu sei o que me aguarda pelos próximos meses. De qualquer maneira, a mensagem - que é o que de fato importa -, é uma verdade tão verdadeira que eu não poderia deixar de colocar aqui:

"A sociedade tem o direito de contar com os serviços de jornalistas e de veículos noticiosos que sejam ativamente livres, assim como tem direito a hospitais que sejam higienizados e a escolas em que os professores não pratiquem a impostura. [...] A liberdade é dever para o jornalista na exata medida em que é um direito para o cidadão."

Tão importante quanto saúde, educação e todos os outros serviços aos quais os cidadãos tem direito, é a comunicação. Não estamos falando de qualquer uma, e sim aquela que chamamos "de qualidade". A que todos querem, ou deveriam querer, produzir.

É óbvio que não é fácil. Mas não custa nada achar uma bela de uma idéia, não? :)